quarta-feira, 2 de junho de 2010

Conto - Angústia

Tive que escrever um conto para a Pós baseado em algum fato real ou fictício e escolhi falar do acidente que sofri no ano passado, claro que deixando a inspiração fluir, pois nada disso aconteceu comigo.

Angústia

Eu tentava gritar, mas minha voz não saia. Eu tentava me mexer, mas meus membros permaneciam imóveis. Eu tentava cuspir o gosto acre de terra e sangue, mas minha cabeça não se virava para lado algum. Eu tentava respirar fundo, mas uma chapa fria de metal pressionava meu peito e meu abdômen. Eu tentava me lembrar do que havia acontecido, mas as imagens se embaralhavam em minha mente: trânsito, curva, choque, escuridão. Eu tentava dormir e deixar o sono eterno me tirar dessa angústia, mas meu cérebro não me permitia esse descanso.
Tudo o que ouvia eram vozes distantes, indistintas, gritos, sirenes, o som cortante de uma serra contra o metal e o resfôlego de minha própria respiração. Tudo o que via era a escuridão. Tudo o que sentia era uma dor lancinante percorrendo meu corpo e o frio do metal sobre meu tronco em contraste com o sangue ardente que escorria de minha perna esquerda e de minha testa. Tudo o que pensava era que estava enterrada viva. Será que os bombeiros sabem que estou presa aqui embaixo? Será que eu já morri? Será que ficarei tetraplégica? Será que minha mãe já sabe o que aconteceu? Será que vou chegar a Parati para a Flip? Será que se eu desmaiar não acordo mais?
As vozes ficaram mais próximas, ouvi alguém gritar que havia uma pessoa sob os escombros. Será que eles estavam falando de mim? Ou teria mais alguém presa como eu? Aaaaaaiiiii! Não, não foi nada, apenas o barulho ensurdecedor da serra cortando uma chapa próxima a meu ouvido. Acho que eles sabem que estou aqui, então! Será que eu consigo gritar? Minha garganta está seca, está difícil respirar, o ar quente que sai de minhas narinas retorna ao bater contra o metal que parece estar a menos de um palmo de meu rosto. Está mais claro agora, vejo uma luz forte entrando por um buraco. Ou será o túnel que as pessoas que passam por experiências de quase-morte dizem enxergar? Minha perna dói tanto que já nem dói mais. Minha cabeça lateja. Acho que vou desmaiar.